Os cem anos de Allende

Em agosto de 1968, cumprindo missão jornalística no Chile, à época presidido por Eduardo Frei, entrevistei o então senador Salvador Allende. O seu ar doutoral destacado pelos óculos de lentes grossas e o perfil de líder nada carismático me chamaram a atenção e as suas declarações me soaram ingênuas, fora da realidade chilena e continental, bem à feição de um visionário.

Após três derrotas sucessivas como candidato a presidente do Chile, conseguiu eleger-se (como Lula) na quarta tentativa. Isto foi em 1970, dois anos após a entrevista. Em 1973, seu governo foi derrubado pelo golpe militar e ele morre no Palácio La Moneda, onde entrevistara seu antecessor Frei. Sua morte foi suicídio ou assassinato? As duas versões persistem, a primeira com mais insistência. Sobre o que não há duvida é que o seu corpo foi encontrado pelos bombeiros dentro do La Moneda bombardeado pela força aérea: baleado na cabeça pelo fuzil russo AK-47. O mesmo que ganhara de Fidel Castro, de quem era admirador. E talvez o tenha levado a confundir o Chile, com sua classe média sólida e instituições democráticas de padrão britânico, até no chá das cinco no Congresso, com a ilha de Cuba, remanso de burgueses endinheirados que ali tinham suas mansões e seus negócios, antes do castrismo. A ponto de levá-lo a uma aventura, mesmo após haver conquistado o poder pela via democrática. Pois ele foi o primeiro socialista a ser eleito para a Presidência da República, com 36,3% dos votos válidos.

Salvador Allende Gossens completaria cem anos no próximo 26 de junho e seu aniversário será comemorado, durante ato político-cultural, promovido pela Fundação Salvador Allende, em Santiago, na Praça da Constituição.