Amar – e saber - o Sertão, para resultados
Comecei a pensar este artigo ao ler na Muito a reportagem Por que ver o céu, de Katherine Funke, fazendo-me outra indagação: Por que saber o sertão. O pedaço de chão, grande ou pequeno, em que nascemos, é a matriz do que seremos e faremos pela vida afora. A nossa aldeia é este útero externo em que somos gerados pela segunda vez, mais visível no campo, e mais aconchegante pela maior intimidade com a paisagem, mas existente também na cidade. A aldeia do urbano é a rua, a praça, a avenida, até mesmo o bairro do seu nascimento. E que a escola, em geral, ignora, na dimensão rural ou citadina, indiferente às raízes da criança ou do adolescente.
Recentemente, o senador Cristovam Buarque fez da tribuna revelação bem esclarecedora sobre o que se ensina ou não se ensina de Geografia na sala de aula. Nascido em Recife, onde residiu e estudou, não lhe apresentaram ao Capiberibe ou Beberibe da Veneza brasileira mas ao Rio Sena, que banha París, do outro lado do Oceano. Nasci no povoado da Serra Negra (hoje município de Pedro Alexandre), sobre a qual os professores ainda silenciam e para a qual as pessoas olham, todos os dias, mas não a vêem. E nem se dão conta do riacho perene e maltratado, afluente anônimo do Vaza Barris, sempre servidor, que matou a sede de humanos e animais, na seca de 1932, no seu modesto leito e nas entranhas marginais feitas cacimbas. Como não sabem que nas fraldas daquela Serra Negra nasce o Rio Sergipe, correndo mais de 140 km, até lançar-se ao mar, em Aracaju.
À Geografia deve caber, a começar da escola, a função de dar base racional a esse amor espontâneo que se tem pela terra natal, fonte de patriotismo e de humanismo, do universalismo traduzido na expressão aldeia global. Basta oferecer ao aluno os fundamentos capazes de instrumentalizar o adulto cidadão para a tarefa de contribuir no sentido da melhor organização dos espaços local e regional, com vistas à produtividade e à sustentabilidade. Eis um tema ostensivo na agenda das urgências já identificadas no contexto do Submédio e Baixo São Francisco e do Vaza Barris.
Como salienta a reportagem da Muito (A Tarde, 7 de junho), 2009 é o Ano Internacional da Astronomia, que estimula o olhar com mais atenção para o céu. Que seja também um Ano Especial da Geografia no correspondente estímulo ao olhar mais atento para a terra, ameaçada pelo aquecimento. E aos brasileiros nordestinos, para o bioma Caatinga, navegando à mesma feição da onda que empurra o recente e crescente protagonismo da Amazônia. E se detenha o tempo necessário no espaço moldado pelas usinas de geração de energia da Chesf, a fim de que, esclarecida pela Geografia melhor ensinada e aprendida, a Companhia gere para toda esta região, no espírito do seu primeiro presidente Alves de Souza, o desenvolvimento que gerou para o Nordeste litorâneo.
Até para assinalar o sesquicentenário da visita do Imperador Pedro II, em 1859, à cachoeira de Paulo Afonso, sacrificada em nome do progresso que não beneficiou ainda o seu entorno, marcado pelo atraso e pobreza. E afinal se encontre o caminho da articulação completa de suas partes através da Região Administrativa Integrada de Desenvolvimento, incorporando, com municípios da Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe, o Território Itaparica (do programa federal Territórios da Cidadania), do Submédio São Francisco, e o Pacto Alagoas/Sergipe, do Baixo São Francisco.
Isso não será alcançado sem a participação ativa do conjunto da sociedade, que desperte do seu sono as chamadas lideranças políticas. Criado para matriz tecnológica do Nordeste seco, o Instituto Xingó pode ser um dos principais condutores dessa mobilização cidadã, sustentada no conhecimento geográfico, em parceria com as universidades dos quatro estados. Dois professores, Roberto Ricardo, com o seu livro Paulo Afonso e o Sertão Baiano: Sua Geografia e seu Povo, e Sérgio Malta, com sua tese de mestrado em Geografia, Produção do Espaço Urbano – Regional na Área das Hidrelétricas do Submédio São Francisco, deram, sem alarde, exemplo à espera de seguidores (Este artigo foi publicado no jornal A Tarde, em sua edição de 16 de junho de 2009).
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