Todos Moram no Município

(Este artigo será publicado em A Tarde, edição de 3 de outubro de 2008)

Lula: O coronelismo versão federal

Eis uma velha máxima que nunca deixou de ser atual: “Ninguém mora na União, ninguém mora no Estado, todos moram no Município”. Daí a importância das eleições deste domingo para prefeitos e vereadores. E, se ao eleitor cabe a responsabilidade do voto, seguida da vigilância sobre o comportamento do votado, cabe à imprensa, primeiro, municiá-lo com as informações sobre o candidato, para dificultar a eleição de político com “ficha suja” ou incapaz. Depois, acompanhar as ações dos novos mandatários da vontade popular nas prefeituras e nas câmaras, sempre estimulando a participação comunitária.

A excessiva exposição do presidente da República no decorrer da campanha foi um prejuízo para o regime supostamente vigente, que é baseado na representação popular, neste caso de base local (onde mora o votante). Com essa distorção eivada do mesmo autoritarismo predominante nas relações com os outros Poderes, em especial o Congresso, se instaurou uma espécie de coronelismo federal, sucedâneo “aperfeiçoado” daquele outro prevalecente nos grotões nordestinos do atraso, transfigurado, mas atraso.

Estilo pouco republicano

A briga pela exclusividade de Lula, traduzida numa gravação de apoio, em geral ilustrada por uma montagem fotográfica no qual o candidato aparece ladeado pelo presidente e pelo governador do seu partido, foi a face mais visível e ostensiva dessa deturpação do processo de escolha dos gestores municipais. A tal ponto que se esse recurso mágico não esteve ao alcance do interessado, ele quase sempre deu um jeito para disfarçar a orfandade do amparo federal.

A poucas horas das eleições, ainda não se pode avaliar, em toda a sua extensão, o efeito desse procedimento pouco republicano. No Sertão Baiano, o figurino não foi diferente, embora haja indícios de que, em Paulo Afonso, por exemplo, o resultado eleitoral poderá ter roupagem de outro corte. E até há sinais de que esta comunidade regional, com eixos nos rios São Francisco e Vaza-Barrís e na Chesf, já cansou de promessas, principalmente quando à recuperação do Hospital Nair Alves de Souza e do sistema viário, a BR-110 em primeiro lugar.

Reação regional

E se mobilizará para exigir tratamento compatível com a sua importância econômica e estratégica. A depender dos prefeitos e vereadores que venham a ser eleitos, quem sabe, afinal, ganhará corpo a idéia da criação, por Lei Complementar, da Região Administrativa Integrada de Desenvolvimento do Submédio e Baixo São Francisco. Com seu respectivo Programa Especial de Desenvolvimento, abrangendo os pólos de Paulo Afonso(BA), Petrolândia(PE), Piranhas(AL) e Canindé do São Francisco(SE), a Ride deverá corresponder, no espírito da Constituição Federal, à instituição ampliada do Protocolo de Cooperação firmado, em novembro de 1996, entre a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) e o Banco do Nordeste. E com o mesmo objetivo, o de fortalecer e modernizar a agropecuária, a piscicultura, o turismo, além das micros, pequenas e médias agroindústrias, localizadas na área de influência das hidrelétricas de Itaparica, Paulo Afonso e Xingó, e que ainda poderá sediar uma usina nuclear, sem esquecer seu potencial eólico e para energia solar e produção de biocombustíveis.

O movimento paralelo pela perenização do Vaza-Barrís pode contribuir para que o espaço geográfico da Ride vá se afirmando como uma associação informal de municípios antes que o Governo Federal crie a Região Integrada. Em sua versão mais simples, o Projeto de Perenização consiste em reverter o fluxo do Riacho Macururé, que deságua na represa de Itaparica e tem uma extensão de 123km, mas, na maior parte do ano, fica com seu leito seco. O projeto prevê a construção de uma série de pequenas barragens.

Pés e mãos nos cofres públicos

É de esperar-se que sejam rejeitados nas urnas os políticos com a só qualificação de saberem, como ninguém, meter os pés e as mãos nos cofres públicos, abraçados ou não com presidente e governador. Do contrário, tudo não passará de fogo de palha, iniciativa após iniciativa morrendo no nascedouro, enquanto prefeitos e vereadores sem espírito público enriquecem a si, seus familiares e seus apaniguados. E aí não há Região Administrativa Integrada de Desenvolvimento que ponha fim às desigualdades entre pessoas e entre municípios.