
O legado de JK foi dissipado com mais facilidade do que está sendo prejudicado o de FHC, traduzido na estabilidade da economia construída pelo real, o tiro certeiro prometido por Collor contra a inflação, mas desferido por Fernando Henrique. Tirante a ameaça de repeteco inflacionário que tornou cinzento o cenário, no período entre a vitória de Lula e sua posse, pois se acreditava que o presidente eleito ia fazer no governo o que o candidato prometia na campanha: mudar a política econômica e declarar guerra ao FMI. Afinal, só recentemente Lula se autodefiniu como a “metamorfose ambulante”, criada pela irreverência de Raul Seixas.

Tudo isso vem a propósito da entrevista de Roberto Freire, presidente nacional do PPS, à IstoÉ desta semana, que ainda não chegou às bancas em Paulo Afonso. Nela, o ex-deputado assume a versão de que o 1º de abril de 1964 foi um contragolpe da direita ao golpe em preparo da esquerda.
A seguir, no Pinga-Fogo de Inaldo Sampaio, o conteúdo comentado da entrevista “Freire muda de opinião sobre 64”:
“Uma entrevista do presidente nacional do PPS, ex-deputado Roberto Freire, à revista IstoÉ desta semana, é um documento histórico da maior importância pelas opiniões que ele emite sobre o movimento militar de 1º de abril de 64, que os vitoriosos chamam de “revolução, e os derrotados de “golpe militar”.
Freire, um ex-militante do PCB cujo comitê central foi quase que integralmente dizimado pelas forças que tomaram o poder naquela época, resolveu assumir, publicamente, a mesma opinião que foi externada centenas de vezes pelo coronel do Exército Jarbas Passarinho, um dos principais ideólogos daquele movimento.
Passarinho sempre sustentou que em 1º de abril de 64 não houve golpe e sim um “contragolpe”, para barrar as pretensões políticas do presidente João Goulart e das forças esquerdistas que o sustentavam no sentido de implantar no país uma república de cunho sindicalista. Na entrevista à IstoÉ, Freire deixa de lado a retórica esquerdista que é uma de suas marcas principais durante o regime militar e, pela primeira vez, em público, concorda com Jarbas Passarinho, que foi ministro dos generais Costa e Silva e Garrastazu Médici e um dos signatários do Ato Institucional nº 5.
Textualmente, disse o presidente nacional do PPS: ‘O que houve ali foi uma disputa entre dois blocos que pensavam em regimes autoritários para ver quem dava o golpe primeiro. Triunfou o bloco da direita’. É um reconhecimento explícito à legitimidade do movimento que depôs João Goulart, algo que a esquerda jamais tinha feito. Pena que tenha sido feito com 43 anos de atraso”.
O meu depoimento
Boa parte dos anos 50 foi de militância estudantil, entre Sergipe e Rio de Janeiro, na União Nacional dos Estudantes, continuado, de fins de 1957 à 1958, na Europa, representando a UNE na Federação Mundial da Juventude, em reunião preparatória do Festival Mundial da Juventude, em Viena (Áustria); em Budapeste (Hungria), sede da FMJ; e na União Internacional dos Estudantes, em Praga (Tchecoslováquia) e Conferência Internacional dos Estudantes, em Leiden (Holanda).
Em 1960, já na Bahia, participei da campanha do Marechal Lott à presidência da República, com atuação mais localizada no sudoeste, junto a grupo de que faziam parte os deputados Clodoaldo Campos e Padre Palmeira, Mário Padre, então candidato à Assembléia Legislativa, e Mário Lima, dirigente sindical. Não me causou surpresa a derrota de Lott, mas nem por isso foi menor a decepção, tão certo estava do que viria a acontecer (Situação que se repetiria, muitos anos depois com José Serra e Geraldo Alckmin, embora, nestes dois casos, tivesse apenas exercido o meu direito de voto).
Por outro lado, tive convivência com membros do Partido Comunista, chegando tomar parte, como convidado, de célula ligada a um dos jornais diários de Salvador. Talvez por isso, nos dias próximos ao contragolpe, alguns “camaradas” me prometiam uma bala de ouro, se eu tivesse de ser executado. Sempre mantive estreito contato com os sindicatos e federações de trabalhadores, sobretudo na fase em que trabalhei no Jornal da Bahia, onde, além da atividade de repórter geral, fui titular de uma coluna sindical, circulando por todas as tendências.
Pude, portanto, ser observador privilegiado do quadro político que ia se desenhando no país e acabou no regime militar. Principalmente no decorrer de 1963, chefiando a redação do Diário de Notícias, órgão das Emissoras e Diários Associados, e no primeiro trimestre de 1964, quando, em 1º de abril, caiu o governo Goulart.
Em “A Crônica de Minha Aldeia”, dou o meu testemunho, já concluído, e que não terá acréscimo depois do desabafo de Roberto Freire. Testemunho, aliás, do que acompanhei, como jornalista, até 1970. De lá para cá, é outra história.
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