sábado, 13 de outubro de 2007

Canto de Amor a Serra Negra

Teu perfil parado de fada adormecida
Nunca se desmanchou em minha memória,
Seja no riso dos tempos de bonança,
Com a explosão do verde
Colorido nas flores do pau d'arco,
Ou no semblante triste,
Com o fenecer de tua parte vegetal
Vergastada do estio.

Eu te enxergo aonde quer que vá.
E contigo que comparo,
No orgulho de quem te sabe incomparável,
As serras avistadas em outros mundos.
E quero crer que o meu primeiro olhar
Para este mundo
Se derramou pelo teu corpo,
No deslumbramento inaugural de minha infância.
E ficou como marco
No pacto de amor eterno celebrado
E sempre renovado.

Não raro me surpreendo,
Em sonho ou acordado,
Com o gesto de carinho das minhas mãos
A deslizar por tuas reentrâncias,
Num ser que se confunde com a Própria natureza feita gente.

Se Deus me permitir volver os olhos
Para o que ficou aqui, no chão terreno,
Quando subir mais alto
Para o chão eterno,
Eu quero tê-Ias plantados
No teu ventre fecundo,
Onde me saciei de esperanças
E cultivei meus sonhos
E acalmei minhas ânsias
E esqueci as dores deste mundo...

Ah! minha Serra amorável,
Quanto me doem os males
Que semeiam no teu reino
Os maus semeadores
De ódio, submissão e violência

Em vez de amor, paz e liberdade,
Na comunhão de todos, mirando o teu Cruzeiro.

E como me retribuis,
Enchendo de vigor a minha caminhada,
Sempre uma subida,
Como a de sexta-feira Santa
Pela tua ladeira retorcida,
No ritual do povo
Relembrando o Cristo
Morto no Calvário,
Esta colina que cresceu
E se fez, mais do que Serra,
A Serra Universal da Humanidade,
Salvando o mundo,
Como é preciso que salves,
Serra Negra,
Este recanto do mundo,
Sem o sangue de outros Cristos.

Pedro Alexandre, 1996

Um comentário:

Jota Gomes disse...

QUALQUER SEMELHANÇA É MERA ANALOGIA

Vai-se a primeira bomba despertada...
Vai-se outra mais, mais outra, enfim dezenas...
A cada golpe em terreno espúrio,
Nova “minhoca” [bomba] é anunciada.

E à tarde, ao fim de rígida jornada
Dos que procuram soluções serenas,
Espera-se a aplicação das penas,
Com reclusão do bando em revoada...

Mas quando “mensaleiros” se amontoam
Nas grades, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;

Buscando impunidade as asas soltam,
Fogem. Mas aos pombais as pombas voltam
E eles às prisões não voltam mais...

(Com os devidos encômios à memória do célebre poeta e juiz Raimundo Correia, autor do soneto “As Pombas”).